segunda-feira, 2 de maio de 2016

Querida mamãe


Tradução livre de trecho do livro 
"La verdad en movimiento"
de Bert Hellinger.

A separação

Tu eras uma mulher comum, como milhões de outras mulheres. Algo te atraiu para meu pai. O amor e o instinto os uniram até que ocorreu o que deveria ocorrer: vocês se fizeram homem e mulher no verdadeiro sentido. E assim fui gestado.
Tu me levaste em teu ventre durante nove meses, em uma simbiose íntima. Logo me deste à luz. Teu corpo seguiu me alimentando, inclusive depois do nascimento, até que, passo à passo, pude me desligar de ti. Ainda assim, durante muitos anos, estive sob tua proteção e carinhoso amparo.
Desde o começo estive unido à ti, primeiro inseparavelmente em todos os sentidos, em seguida fui me separando fisicamente: com grande dor no nascimento e, com menos dor, mas com tristeza, no desmame. Então me tornei cada vez mais independente, até que saí de casa e me separei de ti.
O fiz também internamente? Consigo fazê-lo? Por acaso não sigo sendo um contigo em minha alma?

O Divino

A pergunta que surge é: se és como eras, aquela com a qual minha alma deseja converter-se em um só, aquela de quem sigo esperando receber algo? 
O brilho que te rodeia é teu próprio brilho?
Através dessas imagens, desse profundo desejo e expectativas não estou negando o respeito que te corresponde como o ser humano que és?
Será que talvez tenha se concentrado em teu interior algo diferente, algo que vai mais além de ti, algo do qual és um reflexo? O poder e a grandeza disso é o que é grande e poderoso em ti: o amor e a força que dispõe sobre a vida e a morte. Ele se materializa em ti, resplandece através de ti, me atrai e, ainda assim, permanece inalcançável, está próximo e distante ao mesmo tempo.
Em ti, o divino está tão próximo a mim que quase o posso tocar. E, ainda assim, o caminho para Ele és tu que, ao mesmo tempo, é quem se interpõe. Porque, quando deveria prosseguir, fico contigo, como se tu fosses meu céu e minha meta.

A razão

Como encontro, então, mais além de ti, a razão de minha vida? Deixo-te para trás, dispo-me de ti, retiro minhas expectativas e meus desejos que vão mais além daquilo que tu, como pessoa podes dar e oferecer e te vejo como ser humano, simplesmente como a um ser humano. Com luzes e sombras, limitada e grande ao mesmo tempo, também naquilo que não pudeste alcançar, também com tua culpa, se é que, em algum momento, seja permitido a um filho ver e falar deste modo.

O desejo

O que faço então com meu profundo desejo de voltar e de chegar a ti, de voltar a ser um contigo como fomos no começo de tudo? Ai, esse desejo de voltar a ti só me distrai de outro desejo, o desejo de uma união muito maior e abrangente com a razão da vida. Quando alcançada a meta, esse desejo está purificado e além das sensações. É espiritual, claro. Não se move, se compreende e, como resultado, é infinitamente tranquilizador.

O final

E então, o que ocorre contigo, querida mamãe?
Pois da mesma forma que já não te interpões em meu caminho, porque me movimento além de ti, também não me interponho em teu caminho e não te retenho mediante desejos e expectativas. Agora, de minha parte, tu também estás livre para o final.